Entrevistamos uma das lendas do cenário nacional gamer, criador de um dos maiores fóruns ativos de games no país, Ramon Nakamura.
Em meados de 2005 nascia um fórum diferente do habitual, enquanto a maioria dos fóruns brasileiros focavam na pirataria ou ferramentas para isso, o antigo PortalXbox tinha como um de seus pilares a defesa de utilização de games originais.
Com isso a comunidade que cresceu ao seu redor, era diferente das demais, sendo que a maioria de seus usuários eram cordiais, respeitosos e atenciosos.
Com o passar do tempo e o advento das ferramentas, o antigo PortalXbox se torna PXB, e hoje é um dos maiores fóruns de games no nosso país.
A conversa de hoje é com Ramon, um dos criadores do PXB, sendo um dos responsáveis por conscientizar as pessoas sobre a importância de games originais. Ele também é um dos poucos a ter o Xbox MVP que é um título concedido pela Microsoft para pessoas que ajudam na comunidade sobre o console.
Aperta o X: Olá Raymon, comecei a acompanhar seu trabalho em 2008, e de lá pra cá vejo toda a evolução do fórum, mas antes dele, como você começou no mundo dos games? Quais foram as influências? E por que comprou o Xbox caixão?
Ramon: Olá Daniel! Olha, meu primeiro contato com jogos foi com o Atari dos meus irmãos mais velhos, mas eu comecei mesmo a ter noção de videogame com o SNES, quando Super Metroid me fez virar madrugadas em claro (escondido dos meus pais, claro) pra chegar ao fim daquele incrível jogo.
Depois dos cartuchos, passei a ter um videogame pra chamar de meu, com o lendário PSOne. Foi nessa época que também entrei no finado Fórum UOL Jogos, local que me fez despertar uma curiosidade imensa com o mundo da internet. Nessa época eu devia ter uns 15 anos. Foi lá que comecei a escrever, estudar sobre web design e tentar criar projetos que nunca deram certo (criei dezenas de sites no HPG – Home Page Grátis), a maioria deles com o intuito de comunicar sobre o mundo dos games.
Experimentei centenas de jogos, com um amor maior claro pela série Final Fantasy, do qual utilizo o personagem Zell como avatar até hoje. Só pra destacar minha paixão na época, para terminar Final Fantasy VIII, comprei um dicionário Inglês-Português e traduzi cada linha de diálogo para entender aquela história. Pode não ser a mais amada pelos fãs, mas foi um marco na minha vida – inclusive para o meu inglês!
Passei por muitas fases (de ouro) do Fórum UOL Jogos, até que a Microsoft apresentou ao mundo seu Xbox. No começo confesso que parecia algo distante pra mim, mas um trailer em particular fez minha cabeça ir a loucura algum tempo depois: Fable. Ficava imaginando como seria jogar todas aquelas “palavras mágicas” de Molyneux, e juntei dinheiro pra apostar naquela caixa desconhecida. Foram quase 1000 Reais em uma compra pelo Mercado Livre que nunca contei para meus pais pelo medo do negócio (comprar pela internet naquela época não era tão comum), rezando todo dia para que os Correios viessem entregar. E para quem teve o Caixão, sabe o poder que ele tinha. O console era tão sensacional que meus amigos brigavam pra ir na minha casa jogar…
Quando comprei Halo: Combat Evolved, o mesmo sentimento que tive com Final Fantasy acendeu em mim. Fui sugado pelo universo de uma maneira que eu precisava fazer alguma coisa em troca. Foi aí que surgiu o projeto BioHalo, um site que tinha como objetivo trazer para o português todo o conteúdo da série. Na época, publiquei as transcrições dos jogos Halo e Halo 2, e fiz resumos dos livros que haviam sido lançados. Esse trabalho me rendeu um artigo na revista Oficial do Xbox e foi meu passaporte para entrar na equipe do recém lançado PortalXbox.
Aperta o X: Como foi o surgimento do Portalxbox? Você imaginava quais seriam as dificuldades enfrentadas lá em 2005?
Ramon: Antes de começar a falar a respeito do início do PortalXbox, devo esclarecer que a ideia do fórum surgiu através de três outros jogadores: DocAraxá, Malegretti e PHRIOS. Os três foram os idealizadores de todo o projeto do site, e foram eles que ficaram a frente até 2013, quando eu assumi como administrador no rebranding para PXB. Hoje somos DocAraxá e eu o responsáveis direto pelo site.
Entrei para a equipe de moderadores ainda em 2005, logo no início (fui o sexto usuário cadastrado), e sinceramente não fazia ideia das ambições dos idealizadores. Entrei com o intuito de fazer parte de uma equipe que tinha como principal bandeira a originalidade. O mantra que deveríamos seguir era simplesmente não deixar que qualquer discussão sobre pirataria ganhasse força dentro do site. E isso numa era onde a pirataria era cultural entre os consumidores. Ao impedir essas discussões, um sentimento de “injustiça” ganhava força entre os usuários, em uma inversão de valores que claramente deveria ser corrigida.
Aperta o X: Aproveitando o assunto sobre pirataria, naquela época, em que o Playstation 2 ainda estava no auge, a pirataria era muito comum no lar brasileiro. Como foi erguer a bandeira contra um tema que era tão defendido na época?
Ramon: Difícil, desgastante e principalmente, confuso. Não é novidade, já devo ter comentado isso em outras ocasiões, mas eu fazia parte de uma equipe e aplicava regras das quais eu mesmo poderia ser punido. Meu Xbox era pirata, com o famoso chip que ligava e desligava para ser utilizado na Live. Meu único jogo original era Halo 2, comprado apenas para ser jogado na inédita rede online Xbox Live, que todos sabemos que foi um marco para o mercado. Quando o Xbox 360 chegou, com suas travas rapidamente burladas, eu continuei nesse barco, e aquela nova geração de chips permitia algo ainda maior: era possível jogar na Xbox Live mesmo sem jogos originais (algo impossível com o primeiro Xbox).
E foi com o Xbox 360 e sua simplicidade de destravamento que o PortalXbox teve seu boom de usuários. O console era mais barato que o Playstation 3, e o carro chefe Gears of War foi incrivelmente bem aceito e impressionava qualquer um. A nova geração estava oficialmente lançada no Brasil em 2006 (com o console nacional, depois de anos de obscuridade por parte das outras fabricantes), e a fome e desejo pelas informações cresciam a cada dia. Eram inúmeros os tópicos trancados e apagados tentando discutir a pirataria. Dúvidas e mais dúvidas, diariamente… Foram tantas as ações moderativas que os próprios usuários começaram a nos ajudar. “Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”. Algo estava mudando. O mindset do PortalXbox finamente começou a se infiltrar nos jogadores.
Pouco a pouco, com a ajuda dos próprios usuários, conseguíamos vencer facilmente as batalhas diárias. Mas ainda existia uma guerra maior: as discussões diminuíram, mas o comportamento da maioria dos jogadores na vida real ainda era no universo da pirataria. Foi quando a própria Microsoft soltou uma “bomba atômica” que ninguém esperava.
Em 2007, a Microsoft lançou o desconhecido Crackdown, e como estratégia de marketing, colocou um convite para testar uma versão beta de um dos jogos mais aguardados de todos os tempos: Halo 3. Ninguém sabia que ocorreria a maior ação contra a pirataria já vista na mercado de videogames: absolutamente todas as pessoas que experimentassem o beta com um console pirata teria seu console banido da rede online Xbox Live. E foi o que aconteceu. O desejo de experimentar Halo 3 fez com que a maioria dos jogadores fossem automaticamente banidas numa velocidade arrasadora. Foram poucos os que sobraram. Eu mesmo fui vítima do massacre.
As semanas seguintes foram de puro ódio e caos. Era uma novidade que precisava ser absorvida, e o PortalXbox funcionou como um verdadeiro hospital de guerra. As pessoas que não entendiam o que estava acontecendo viam no fórum uma luz no fim do túnel. Todos os nossos esforços se voltaram para os banidos e sobre o que deveria ser feito. O mantra da originalidade começou a fazer sentido. Não valia mais a pena viver no universo pirata, e dia após dia, nossos usuários foram aceitando a nova realidade (ainda que bastante cara).
Consoles banidos eram vendidos, e novos consoles completamente travados e originais foram ganhando espaço. O valor agregado da palavra “destravado” passou a ser quase zero. E uma nova era de jogadores começou a surgir depois daquele evento.
Aperta o X: Lembro que conheci o fórum em 2008 (e até comprei uma camisa da GameShirts – risos). Hoje o Portalxbox é PXB, quando houve essa mudança e como foi a aceitação dos usuários?
Ramon: O PortalXbox cresceu absurdamente junto com a popularidade do Xbox 360 no Brasil. No auge, em 2010-11, o site registrava milhões de acessos mensais, digno dos maiores portais da internet. E isso consumia cada vez mais tempo, e dinheiro. O site rodava em uma tecnologia antiga e muito customizada, que impedia algumas atualizações de novas tecnologias. Essa foi uma das maiores causas que resultou na mudança que decidimos fazer.
Aos poucos os problemas foram piorando, e os períodos fora do ar foram aumentando. Tivemos muitas conversas internas entre a equipe nessa época, e muitas delas tiveram como conclusão encerrar completamente o PortalXbox. Mas resolvemos seguir o caminho da resistência. DocAraxá, eu, e alguns outros moderadores aceitamos que iríamos trabalhar juntos para reerguer o PortalXbox. Contamos com a ajuda de outros amigos desenvolvedores para o trabalho mais pesado e delicado, que era trabalhar com toda a base de dados de anos de discussões.
E conseguimos! Entre mortos (milhares de cadastros excluídos) e feridos, conseguimos colocar o PortalXbox nos trilhos novamente. Com todas essas mudanças, vimos também uma necessidade comercial e legal de retirar o nome “Xbox” da nossa marca, a qual foi registrada como PXB, já que era dessa forma que muitos se referiam à comunidade.
Nosso novo site e fórum nasceram com o principal objetivo de atender aos desejos dos jogadores de Xbox. Nossos esforços passaram a ser em torno de manter a essência da comunidade, que possibilita discussões maduras e evita a toxidade que começou a reinar no “mundo da internet”. E acho que nessa área conseguimos alcançar o sucesso até hoje.
A partir desse trabalho com o novo PXB, em 2014, recebi da Microsoft o título de MVP (Most Valuable Professional), concedido a pessoas que não trabalham na Microsoft, mas que agregam valor aos produtos da empresa de alguma maneira. O programa no início não tinha grandes vantagens, mas de uns dois anos para cá, o envolvimento do time de MVPs (que são em torno de 60 pessoas espalhadas pelo mundo) mudou da água pro vinho. Temos a oportunidade de conversar com vários times e equipes do Xbox nos EUA, testar aplicativos e novas funcionalidades antes de todo mundo (as vezes até alguns jogos) e temos um canal aberto que nos possibilita dar um Feedback constante dos anseios e desejos da comunidade com o Xbox. Tudo isso tornou o título de MVP muito mais valioso para o PXB como um todo, já que as discussões que temos em nosso fórum tem uma ponte de ligação direta com a Microsoft. Tudo isso, claro, tem um contrato de confidencialidade, então não podemos vazar as informações que temos acesso (em todo o programa, houve apenas um caso de vazamento, o que contribui para a força do time de MVPs).
Aperta o X: Hoje nós sabemos da influência que o PXB causou na comunidade gamer, principalmente por ser um fórum diferenciado e maduro. Você achou que o projeto chegaria nesse nível? Quais são os próximos passos que você deseja incorporar no desenvolvimento?
Ramon: Eu sempre vi a comunidade como um grande projeto. Quando entrei nele, ainda adolescente e sem muitas responsabilidades, tinha o site como um grande laboratório, com o qual eu poderia “brincar” de trabalhar. Com a nova era do PXB, onde assumi outras frentes, comecei a pensar de maneira diferente, a ponto de estar sempre pesquisando maneiras de trazer conforto para os usuários.
Um dos grandes diferenciais que tornou o PXB uma comunidade bastante forte foram as realizações de Encontros Regionais, organizados pelos próprios usuários. Tivemos em diversas cidades, eventos grandes e pequenos, e que serviram de base para sair do mundo virtual e conhecer as pessoas por trás dos avatares. Com eles vieram também os grandes eventos oficiais do PortalXBox, os Fóruns Nacionais, realizados na sede da Microsoft Brasil. Naquela época em que não existia Brasil Game Show, nosso evento foi um marco na comunicação entre uma comunidade de marca e sua empresa mãe. Foram realizadas cinco edições, com um dia inteiro de atividades que envolviam a Microsoft Brasil, os administradores e personalidades da cena gamer nacional. Em uma das edições, tivemos até o “vazamento” de Forza Motorsport 3, que foi noticiado pelos sites mundo afora.
Apesar de hoje termos um fórum autossustentável (do qual tenho bastante orgulho em ter conseguido esse equilíbrio), por muitos anos ficamos apenas com as contas negativas, e que não eram nada baratas de manter. Mesmo que ainda hoje estejamos enfrentando grande concorrência de outros meios e redes sociais, é gratificante ver o site online 24/7, sem grandes conflitos e com o mesmo alto nível de discussões. Esse é o principal combustível para continuar a manter toda a estrutura viva.
Esse ano atualizamos nosso sistema para conseguir avançar um pouco mais em outros projetos para o site. O principal deles é o retorno de uma área dedicada a notícias, mas que irá funcionar de forma colaborativa, sem a estrutura tradicional na qual um editor/redator é o responsável direto por todas as publicações. A ideia é trazer o usuário para o front, e dar destaque para aqueles que, assim como eu fui no início, tenham vontade de construir e colaborar. Essa nova fase já foi prometida a alguns meses, mas ainda não consegui fazer todos os meios funcionarem de forma satisfatória. Mas vai chegar em breve 🙂
Outras frentes que hoje estamos priorizando é o acesso via smartphone, que já responde por mais da metade dos nossos acessos. As melhorias na usabilidade mobile serão constantes a partir de agora.
Aperta o X: Raymon, sei que deve ter muita história de bastidores (se um dia for lançar um livro me avise para eu comprar no day one – risos), mas você poderia nos contar alguma história marcante ou que você se lembra com carinho a respeito do fórum?
Ramon: Pior que já pensei em escrever um livro, haha. Tem até uma imagem do que seria a capa 🙂 . Um fato que gosto bastante de lembrar é de como eu me comportava quando era apenas um moderador. Muitos usuários antigos vão lembrar disso, mas eu era frequentemente acusado de ser um sonysta, e muitos inclusive questionavam minha posição dentro da equipe do PortalXbox. Hoje não dá para negar que eu realmente fazia diversos comentários ácidos nas discussões de Xbox 360, mas isso não era pelo fato de eu não gostar da marca ou algo parecido, muito pelo contrário.
Como designer, sempre tive um papel de querer abstrair o máximo de informações para construir um projeto, e nesse tipo de trabalho é necessário forçar a pessoa a falar, tanto para o bem quanto para o mal. E era exatamente isso que eu fazia. Quando eu escrevia alguma crítica, não era de forma gratuita, eu queria que os usuários me questionassem e levantassem seus pontos de vistas, a fim de trazer novos pontos para as discussões. Naquela época, quando a internet era mais “tranquila”, digamos assim, isso funcionava perfeitamente. Hoje, agir dessa maneira é um pouco perigoso, tanto que abandonei completamente essa forma de interação.
De vez em quando, quando escrevo algo mais crítico em relação ao Xbox, algum usuário relembra dessa minha época “obscura”, e teve uma vez que até brinquei com o nome PXB, afirmando que assumiríamos ser a sigla de Playstation Xbox Brasil. Mas que fique claro que isso não é verdade.
Aperta o X: Depois se quiser revelar a capa, me mande por favor (risos). Você poderia falar um pouco sobre os outros projetos em que você também trabalha? Como o PXB Kids.
Ramon: O PXB Kids é um projeto idealizado pelo DocAraxá, também MVP de Xbox e administrador do PXB. Todo final de ano dedicamos um tempo para encontrar instituições carentes que trabalham com crianças e que precisam de ajuda, seja com alimentos, brinquedos ou algum outro item necessário para o bom funcionamento do local. Alguns usuários também participam dessa ação, os quais denominamos como Embaixadores PXB Kids.
Com as dificuldades financeiras que o site passou, o programa encolheu um pouco, mas continuamos a mantê-lo mesmo que de forma reduzida. A projeto é reconhecido pela Abrinq, e o PXB é oficialmente um Empresa Amiga da Criança.
Aperta o X: Muito obrigado pela atenção Raymon, quer deixar alguma mensagem para nossos leitores?
Ramon: Gostaria apenas de agradecer o espaço para poder contar um pouco mais da nossa história para os leitores. Tenho bastante orgulho de fazer parte da equipe e de poder conduzir o site com os mesmos ideais dos quais ele foi pensado. E também, claro, fazer um convite para aqueles que também gostam do Xbox e ainda não conhecem o nosso fórum, para que deem uma passada por lá e se juntem a nós, serão todos muito bem recebidos!
- Link do Fórum PXB: pxb.net.br
- Gamertag: RAYMON BRX
- Facebook: Ramon Nakamura
- Twitter: RAYMONbr
- Instagram: _raymon
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Abraços pessoal, até a próxima.
Sou usuário do PXB desde 2013 e é com certeza um fórum especial. Parabéns pelo ótimo trabalho feito lá! Excelente entrevista.
Obrigado pelo comentário Alex.
Grande abraço jovem.
muito bom!!!!! valeu
Opa, obrigado pelo comentário jovem.
Grande abraço.