Entrevista com Mário Fittipaldi da VideoGame

Conversamos com um dos pioneiros do jornalismo gamer no Brasil.

Se você lembra das revistas da década de 90, com certeza já viu e conhece a clássica VídeoGame, revista que teve sua primeira edição publicada nas bancas em Março de 1991, e juntamente com a publicação, criou uma legião de fãs pelo país.

A revista teve sua última publicação em Julho de 1996 e deixou saudades aos leitores.

Recentemente, conversei com Orlando Barrozo, e perguntei sobre a época da saudosa VideoGame, e ele me disse que o especialista do assunto gamer na editora era o Mário Fittipaldi.

Então fui em busca do Mário, e tive o privilégio e honra de conversar com ele, um dos pioneiros no jornalismo gamer e que deixou seu legado no nosso meio.

Mário Fittipaldi curtindo a paisagem rs

Aperta o X: Olá Mário, primeiramente é uma honra ter você aqui no Aperta o X, gostaria de dizer que sou fã do seu trabalho no jornalismo, e o trabalho na VideoGame foi uma fonte de inspiração para o meu trabalho aqui no Aperta o X. Você poderia contar um pouco da sua história para gente? Como você virou jornalista, e como foi trabalhar na VideoGame?

Mário: Obrigado! Bom, eu virei jornalista quase por acaso. Simplificando: estudei engenharia, larguei no segundo ano porque não gostava e fui estudar música – que não larguei até hoje. Mas queria ter uma formação superior, embora não soubesse exatamente o que cursar. Só sabia que seria na área de humanas. Resolvi prestar vestibular para Direito, que é uma tradição familiar, e, como gostava de escrever, prestei também para Jornalismo. Passei nas duas, e acabei escolhendo Jornalismo meio que pra fugir da pressão da família… Acabou que me apaixonei pela profissão! Hoje, com 57 anos e mais de 30 de carreira, posso dizer que fiz a escolha certa!

Aperta o X: Também gosto de Jornalismo, Mário, a primeira edição da VideoGame foi uma edição especial da Video News, como surgiu a ideia de fazer uma revista dedicada aos games da época?

Mário: Bom, eu trabalhava como repórter iniciante em uma editora, a Sigla, em uma revista de motos – Duas Rodas. E nenhum dos editores tinha a menor ideia do fenômeno que o videogame estava virando. Mas tiveram sorte: uma funcionária da área de administração, intrigada com o interesse dos filhos e dos colegas deles, deu a ideia. O fato de ter sido uma edição especial da Video News foi só uma questão prática, pois só se gastaria tempo e dinheiro com registros e marcas se a revista desse certo. Ainda bem que deu!

Aperta o X: Tanto que ficou cerca de 5 anos no mercado, realmente foi um sucesso.

Hoje em dia temos a facilidade da internet para montagem de notícias e matérias, como era feito as pesquisas e descobertas naquela época para a montagem desses conteúdos? (lembro até que na primeira edição tinham imagens do Neo Geo, que era um sonho de consumo meu – risos)

Mário: De verdade, não tinha muito jeito, era preciso usar o correio – físico, claro. Tinha contato com os principais produtores de games da época, como Capcom, Konami e outras. No caso da Sega, a Tectoy facilitava o acesso para nós. Todo mês, recebíamos notícias e fotos desses produtores. Esses contatos eram feitos e renovados em feiras nos EUA – na época, os produtores participavam de uma feira de eletrônicos para consumo chamada CES – Consumer Electronics Show, realizada anualmente em Las Vegas. Fui em vários anos. Enfim, o velho e bom networking, que naquela época dava um trabalho danado pra fazer! Lógico, a informação muitas vezes demorava pra chegar, mas também não havia essa necessidade por imediatismo que tem hoje. A gente também “cozinhava” textos de revistas gringas – ou seja, reescrevia mantendo as informações, mas alterando o estilo. E só copiávamos as fotos de divulgação, que não tinham problemas de direitos autorais – chamávamos isso de Gillete Press, uma espécie de precursora do Ctrl-C/Ctrl-V…

No caso das matérias sobre os jogos, não tinha outro jeito: precisava jogar até o fim e fotografar cada etapa, cada tela. Fotografar mesmo: o Norberto, que era o fotógrafo, montava a câmera em um tripé em frente à TV e clicava cada dica. Detalhe, era com filme, que precisava ser revelado. Só víamos o resultado uns dois ou três dias depois – não raro, tinha de repetir porque as fotos não estavam boas…

Fotógrafo Norberto Marques

Aperta o X: Nossa, para games difíceis devia ser bem frustrante ficar refazendo as fotos.

E como foi montado o sistema de avaliação dos games com os 3 pilares sendo Gráfico, Músicas / Efeitos Sonoros e Dificuldade?

Mário: Bom, a gente achava que esses eram os fatores que determinavam se um jogo era bom ou não. Acho que até hoje dá para usar um sistema parecido, não?

Aperta o X: Sim, inclusive no Aperta o X, nossos pilares são baseados nesse conceito, tendo a divisão entre Som, Gráfico, Controle / Jogabilidade e Diversão.

E como era a sensação de ter trabalhado numa redação de games lá nos anos 90? Existia um carinho dos fãs e leitores?

Mário: Sim, o carinho era grande. Até hoje, aliás. Vira e mexe alguém me acha no Facebook ou no Insta e pergunta se eu sou o mesmo cara da VideoGame. É incrível isso. Mas eu acho que a gente fazia por merecer: respondíamos todas as cartas, se não na revista, diretamente para os leitores; atendíamos todo mundo que ligava – e os caras ligavam no apuro, dizendo: “Rápido, rápido, o Boss vai me matar” e coisas assim…

Aperta o X: Eu imagino. Mário, a partir da segunda edição, começamos a ver uma outra cara para a revista, e junto dela vem um personagem, uma criança loira, geralmente com óculos escuros. Ele foi criado para ser a mascote da revista (o Lig)? Como foi o processo criativo do personagem?

Mário: Bom, como a primeira edição deu muito certo, a partir da segunda já sabíamos que viraria uma revista independente. O personagem fez parte do processo de criação de uma identidade para a revista, em princípio para ilustrar os sumários, de um jeito lúdico e bem-humorado. O fato é que os leitores gostaram tanto que ele acabou virando mascote da revista. Quem criou foi o Alexandre Ono – nunca mais soube dele, aliás. Mas era um cara muito talentoso!

Estúdio improvisado, Mário está sentado com uma prancheta.

Aperta o X: Eu me lembro que era um dos destaques e marcas da revista mesmo. Teve algum game naquela época que te impressionou positivamente, que você tenha gostado bastante?

Mário: Sempre fui um péssimo jogador, exceto no caso de jogos de corrida. Gostava muito de um jogo para PC da época chamado World Circuit, que era um simulador de F1 que permitia jogar em rede via modem e telefone – jogávamos depois das 8 da noite para não gastar fortunas em ligações telefônicas. Nunca consegui jogar futebol (perco no Fifa de lavada de qualquer um, PES eu sequer consigo jogar…), tomo pau em todos os jogos de luta, jamais consegui jogar Street Fighter ou Mortal Kombat. Ninguém acreditava que eu era capaz de trabalhar em uma revista de videogame, quanto mais editar. Mas esse era o segredo: eu editava, então precisava só entender a mecânica dos jogos e do mercado, não precisava saber jogar. Quem jogava era o Toni Cavalheiro, o Júnior, entre muitos outros “pilotos” (como a gente chamava os meninos que jogavam) que passaram pela revista…

Aperta o X: E teve algum que você tenha odiado (risos)?

Mário: Todos os de luta… Brincadeira, no fundo, eu gostava deles. Só não conseguia jogar. Nunca tive muita paciência para RPGs, nem reais nem na telinha da TV. Mas, como era profissional, tinha de encarar os jogos de maneira isenta e sem preconceitos. Sempre trabalhei com isso em mente. Assim, é difícil destacar um jogo que eu tenha odiado.

Aperta o X: E hoje, você ainda costuma jogar alguma coisa?

Mário: Jogo essencialmente games de corrida, como Gran Turismo, Need for Speed… Também, com o meu sobrenome, não podia ser diferente, né? Como não tive filhos, parei no PS3. E, como uso Mac, nunca mais joguei em PCs.

Aperta o X: Claro, grande nome Fittipaldi (risos). Após a saída da editora da VideoGame, qual foi sua trajetória?

Mário: Fui para uma editora pequena chamada BQ1 trabalhar em uma revista de computação para crianças, que tinha um acordo com uma rede de escolas de informática chamada FutureKids. Esta editora tinha uma revista de carros e foi anexada por um grupo alemão chamado MotorPress, e então eu passei a trabalhar em uma revista de automobilismo. Depois, vim para a Editora Europa, onde estou há 22 anos… E contando! Lá, fiz de tudo, de revistas de informática a motocicletas, design gráfico, tecnologia de consumo, arquitetura e design de interiores…

Imaginem o trabalho de fotografar e criar essa página do Sonic, equipe talentosa

Aperta o X: Que correria, e hoje o que você anda fazendo?

Mário: Neste momento, estou trabalhando em uma coleção de livros técnicos sobre orquídeas (!)… Mas também escrevo matérias sobre fotografia para a revista Fotografe Melhor, que eu adoro, e de turismo para a revista Viaje Mais, que eu também adoro. Todas da Editora Europa.

Aperta o X: Mário, muito obrigado pela entrevista, foi uma honra conversar com você. Você gostaria de deixar algum recado para nossos leitores, para os fãs da revista VideoGame ou para aspirantes a redatores?

Mário: Imagine, a honra foi minha. Bom, não sei se sou uma pessoa adequada para dar conselhos… Mas, enfim, se tem algo que posso dizer, por experiência própria, é que, qualquer que seja a escolha profissional, é preciso sempre alargar horizontes, buscar conhecimento de outras áreas. Isso nos ajuda a pensar com a mente mais aberta ao novo e, sobretudo, a aprender a respeitar as diferenças. Esquecer os preconceitos e se abrir ao novo deve ser um exercício diário. Do contrário não estaria hoje escrevendo sobre orquídeas e tantas outras coisas…

Quem quiser acompanhar meu trabalho, é só conferir em @fittipaldi.mario. Sou mais assíduo no Instagram!


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Lembrando que, se você gosta de revista de vídeo games, confira também nossa entrevista com o Baby Betinho da SGP clicando aqui.


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Abraços pessoal, até a próxima.

One thought on “Entrevista com Mário Fittipaldi da VideoGame

  1. Bons tempos da Revista VideoGame!!!! Lembro de comprar a revista no auge do lançamento do Super famicom…aquela edição com o super mario world na capa e uma matéria sobre o game Phantasy Star do Master system, bons tempos!!!! Lembro de que a revista tinha um bom e simples visual caprichado…as vezes fotos de jogos de game boy color não sairam boas (Super Mario Land, tartaruga ninja e Operation Contra especificamente)!!!! A revista foi evoluindo, mas…eu gostava mesmo das primeiras edições que tenho boas lembranças, aquela fase 8 e 16 bits. Tenho boas lembranças e realmente ficava imaginando como era tirar fotos dos jogos e da dura batalha de zerar batletoads do nintendo…A revista VideoGame que teve destaque também sobre o game batletoads me traz boas lembranças do game, amigos e principalmente dos anos 90. Valeu galera!!!!

    1. Nós que agradecemos o comentário Helinux.
      Naquela época havia um charme né na revista, também gostava bastante, lembro que foi a única revista que encontrei (pode ter tido mais, mas realmente não lembro) que tinha conteúdo sobre o Teenage Mutant Ninja Turtles: Tournament Fighters, o jogo de luta das Tartarugas Ninja rs…
      Grande abraço jovem.

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